por Enéas Xavier, doutorando em direito internacional pela Université de Montréal e pesquisador do Instituto Aimara
1. Uma Sessão Marcada por Tensão e Expectativas
2. Um Acordo de Compromisso para Avançar
O impasse só foi resolvido após intensas consultas conduzidas pela presidência da COP 29, exercida pelo Azerbaijão, que buscou mediar os interesses divergentes entre os grupos de países. O acordo alcançado não contemplou a inclusão formal dos dois pontos na agenda, mas instituiu mecanismos alternativos para que fossem abordados no decorrer dos trabalhos:
O tema do financiamento climático, nos termos do Artigo 9.1, será tratado por meio de consultas substanciais conjuntas conduzidas pelos presidentes do SBI e SBSTA. Foi reconhecida a possibilidade de que, futuramente, esse assunto venha a constituir um item autônomo de agenda.
As preocupações relativas às medidas comerciais unilaterais serão discutidas indiretamente em outros itens relevantes, notadamente no programa de trabalho sobre transição justa. Para registrar essa abordagem, uma nota de rodapé foi incluída no item correspondente da agenda.
Esse arranjo permitiu uma saída honrosa para todos os lados, mas não impediu demonstrações de insatisfação. Diversos países em desenvolvimento lamentaram a ausência de espaço formal para o debate direto sobre os temas propostos, especialmente o financiamento, que consideram um pilar essencial para a implementação efetiva das contribuições nacionalmente determinadas (NDCs), dos planos nacionais de adaptação e das medidas de transição justa.
3. Reações das Delegações e Clima Político
A reação das Partes ao acordo refletiu o equilíbrio precário entre o pragmatismo diplomático e o descontentamento. O grupo G77 + China, que reúne a maioria dos países em desenvolvimento, insistiu na necessidade de assegurar a previsibilidade e adequação dos fluxos financeiros, ressaltando que sem recursos não haverá ação climática significativa nas nações mais vulneráveis.
A União Europeia, por sua vez, defendeu seu posicionamento, lamentando que suas motivações tenham sido mal interpretadas e conclamando as Partes a respeitarem as diferentes perspectivas com espírito construtivo. O bloco reiterou seu compromisso com o financiamento climático, mas em bases que, segundo seus representantes, sejam consistentes com a arquitetura atual do Acordo de Paris.
Apesar das tensões, prevaleceu o entendimento de que destravar as negociações era fundamental para o sucesso da conferência. O episódio revelou, mais uma vez, a importância do equilíbrio político e da capacidade de construção de compromissos no processo climático multilateral.
4. Uma Mensagem Clara do Secretariado
5. Retomada dos Trabalhos Substanciais
Com o desbloqueio das agendas, os presidentes do SBI e do SBSTA anunciaram a estruturação formal dos grupos de contato e reuniões informais destinadas ao tratamento dos principais temas. Foram confirmados, entre outros, os seguintes espaços de negociação:
Grupo de contato sobre o programa de trabalho da transição justa;
Grupo de contato sobre medidas de resposta e impactos socioeconômicos das políticas climáticas;
Grupo de contato sobre abordagens não mercadológicas previstas no Artigo 6.8 do Acordo de Paris;
Sessões sobre cooperação com outras organizações internacionais, com foco na sinergia de ações multilaterais.
Essa reorganização da agenda operacional permitiu o início efetivo das deliberações técnicas, criando condições para que as Partes avancem na redação de conclusões e eventuais recomendações para a COP 29 e a CMA 6, que ocorrerão em Baku no final do ano.
6. Espaços Paralelos: Quando a Sociedade Ocupa a Conferência
Durante os dias de bloqueio, a ausência de negociações formais não impediu o avanço das articulações informais e dos intercâmbios técnicos. Oficinas, eventos paralelos e sessões promovidas por organizações da sociedade civil, academia e setor privado preencheram os vazios institucionais, promovendo discussões sobre soluções climáticas, justiça intergeracional, financiamento baseado em necessidades e transição energética justa.
Esses espaços desempenham um papel vital na dinâmica das conferências da UNFCCC, funcionando como laboratórios de ideias, pressão política e fóruns de construção de consenso entre atores não estatais e delegações nacionais. A intensa participação nos eventos paralelos reforçou a importância da presença da sociedade civil e de outros observadores credenciados na governança climática internacional.
7. Protestos em Bonn Expõem Contradições do Brasil entre Liderança Climática e Expansão Fóssil
Durante as negociações climáticas preparatórias da COP30 em Bonn, ativistas pelo clima e representantes indígenas realizaram protestos dentro do local do evento contra o leilão de blocos de petróleo e gás promovido pela ANP no Brasil. Grandes faixas com dizeres como “No More Fossil Fuels”, “Climate Leadership Is Not Made of Oil” e "Our Future Is Not Up for Sale" foram exibidas, acompanhadas por uma cerimônia conduzida pelo Cacique Ninawá Huni Kui. O protesto sinalizou forte oposição à postura do governo brasileiro, que ao mesmo tempo em que busca se posicionar como líder climático na COP30, realiza uma extensa oferta de concessões de petróleo em áreas sensíveis, como a margem equatorial da Amazônia, cuja biodiversidade e relevância climática são elevadas.
A crítica central gira em torno da incoerência entre discurso e prática. Luene Karipuna, do COIAB, enfatizou que a crise climática é também uma crise dos povos indígenas e que combustíveis fósseis são os principais agentes dessa destruição — exigindo uma transição energética justa e financiamentos diretos às comunidades, sem repetir erros de empreendimentos como Belo Monte. Por sua vez, Ilan Zugman, da 350.org, chamou atenção para o contraste flagrante entre o “mutirão” proposto pelo Brasil como presidência da COP30 e a abertura de 172 blocos para exploração, incluindo 47 blocos no delta do Amazonas, sem o consentimento das populações tradicionais — um movimento que “trai o espírito do mutirão” e põe em risco direitos indígenas e a proteção ambiental.
Análises de entidades como Climate Observatory, Observatório do Clima e o Fossil Fuel Non‑Proliferation Treaty Initiative alertam que a assinatura de 19 blocos perto da foz do Amazonas viola compromissos climáticos, compromete a capacidade de limitar o aquecimento a 1,5 °C e frustra a credibilidade do país ao se preparar para sediar a COP30 . Legalmente, aponta‐se violação de tratados internacionais (como a Convenção 169 da OIT), dado que não houve “consulta livre, prévia e informada” às comunidades afetadas. A mobilização em Bonn — combinada com litigância no Brasil e posicionamentos firmes de líderes indígenas — pode pressionar o governo a alinhar ações à retórica e interromper a expansão do petróleo na Amazônia, em nome de uma liderança ambiental coerente e justa.
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